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Reprodução/ YouTube

Filhos mais inteligentes? Tire-os das telas agora

Segundo especialistas, os dispositivos digitais estão afetando seriamente o desenvolvimento de jovens e crianças. E, pela primeira vez na história, a geração dos nativos digitais apresenta um QI menor que o de seus pais.

Por Mariana Curotto, publicado em 04/11/2020 e atualizado hoje.

Eles são ligeiros com os dedos, deslizam-os facilmente entre as telas de tablets e celulares. Jogam jogos online, ouvem música, assistem vídeos, tudo ao mesmo tempo. Os nativos digitais são as crianças que já nasceram em um ambiente com muita tecnologia. Com acesso à internet e contato com os mais variados aparelhos eletrônicos. Mas será que toda essa habilidade com tecnologia os tornam mais inteligentes que seus pais?

Quanto maior o tempo de exposição de jovens e crianças às telas, menor a sua capacidade motora, física e cognitiva. É o que apontam as pesquisas sobre o uso excessivo de tecnologia por crianças e adolescentes.

Pesquisas sobre filhos inteligentes e telas

• A pesquisa TIC KIDS online, realizada pelo Cetic.br em 2018, avaliou quase 3.000 famílias brasileiras com crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos. E concluiu que 86% estão conectados à internet. Deste percentual, 93% o fazem pelo telefone celular. Do total, 24% passam muito tempo na internet e 25% não conseguem controlar o tempo de uso das telas;


• Uma pesquisa realizada pela UNIFESP, com mais de 900 crianças em idade pré-escolar identificou que mais de 55% das crianças faziam as refeições em frente à TV. E que 28% passavam longos períodos assistindo televisão, jogando videogame, usando um computador, tablet ou telefone celular. Além disso, o uso excessivo de telas tornou as habilidades motoras pobres. Acentuou o sedentarismo e diminuiu as horas de sono das crianças;


• Em outro estudo do Hospital de Cincinnati, nos Estados Unidos, que avaliou 47 crianças entre 3 e 5 anos, ficou evidente os danos do uso excessivo de telas. Aquelas que passam mais tempo em frente às telas são as que tem mais dificuldade de alfabetização e um vocabulário menos variado, comparadas às outras;


• Outra pesquisa realizada pela Universidade de Calgary, no Canadá, com 2.441 mães e filhos, também demonstrou os danos nocivos das telas à saúde de crianças pequenas. Ficou evidente no estudo que, quanto maior o tempo em frente às telas, menor a habilidade em empinar blocos, por exemplo;


• De acordo com um estudo da Universidade de Alberta, no Canadá, crianças de 5 anos ou menos, que ficam mais de duas horas por dia em frente a telas, têm chance cinco vezes maior de demonstrar dificuldade de concentração e sete vezes mais risco de apresentar sintomas de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), do que os colegas que, rotineiramente passam menos tempo em frente a tablets, celulares, TVs e videogames.

Vídeo do canal Macetes de Mãe também aborda este tema.

O que dizem os especialistas?

Em entrevista recente à BBC News Mundo, o neurocientista e escritor francês Michel Desmurget, é categórico ao afirmar:

'Simplesmente não há desculpa para o que estamos fazendo com nossos filhos e como estamos colocando em risco seu futuro e desenvolvimento”.

Autor do best seller francês A fábrica de cretinos digitais, Desmurget fala sobre a relação entre o tempo de tela e a diminuição do QI da geração de nativos digitais:

“Vários estudos têm mostrado que quando o uso de televisão ou videogame aumenta, o QI e o desenvolvimento cognitivo diminuem. Os principais alicerces da nossa inteligência são afetados: linguagem, concentração, memória, cultura (definida como um corpo de conhecimento que nos ajuda a organizar e compreender o mundo). Em última análise, esses impactos levam a uma queda significativa no desempenho acadêmico.”

As consequências do uso excessivo de telas

Para o neurocientista, o impacto do uso excessivo de telas na vida de crianças e adolescentes é enorme e pode causar:

• diminuição das interações familiares, essenciais para o desenvolvimento da linguagem e do emocional;

• diminuição do tempo dedicado a outras atividades, como: lição de casa, música, arte, leitura, etc.;

• má qualidade do sono, com redução e qualidade das horas de descanso;

• estímulo excessivo da atenção, ocasionando falta de concentração, baixa aprendizagem e impulsividade;

• baixo estímulo das capacidades intelectuais, que impede o cérebro de desenvolver todo o seu potencial;

• sedentarismo, que impede o desenvolvimento físico e influencia diretamente na maturidade do cérebro.

É o que diz também o Manual de Orientação sobre o uso de telas, #Menos Telas #Mais Saúde, desenvolvido pela Sociedade Brasileira de Pediatria.

Segundo o relatório, estes são os principais problemas desenvolvidos por crianças e adolescentes pelo uso excessivo de telas:

• Dependência digital e uso problemático das mídias interativas;

• Problemas de saúde mental: Irritabilidade, ansiedade e depressão;

• Transtornos do déficit de atenção e hiperatividade;

• Transtornos do sono;

• Transtornos de alimentação: sobrepeso/obesidade e anorexia/bulimia;

• Sedentarismo e falta de prática de exercícios;

• Bullying e cyberbullying;

• Transtornos de imagem corporal e da autoestima;

• Riscos da sexualidade, nudez, sextorsão, abuso sexual e estupro virtual;

• Comportamentos auto lesivos, indução e riscos de suicídio;

• Problemas visuais, miopia e síndrome visual do computador;

• Problemas auditivos e PAIR (perda auditiva induzida pelo ruído);

• Transtornos posturais e musculoesqueléticos;

• Uso de drogas lícitas e ilícitas.

Todas as telas são prejudiciais?

Segundo Desmurget, não se pode negar a revolução digital como algo transformador na vida de nossos filhos. E é importante que saibam trabalhar com softwares, como os utilizados nas aulas de robótica ou informática, por exemplo. Para ele, todas as ferramentas que sejam usadas com fins pedagógicos são importantes para o desenvolvimento cognitivo de jovens e crianças, mas ressalta:

“Porém, quando uma tela é colocada nas mãos de uma criança ou adolescente, quase sempre prevalecem os usos recreativos mais empobrecedores. Isso inclui, em ordem de importância: televisão, que continua sendo a tela número um de todas as idades (filmes, séries, clipes), depois os videogames (principalmente de ação e violentos) e, finalmente, na adolescência, um frenesi de autoexposição inútil nas redes sociais.”

Sobre os possíveis benefícios do uso de telas

Você já dever ter ouvido e até mesmo lido estudos que dizem que os jogos online e aplicativos digitais desenvolvem o cérebro de crianças e melhoram os resultados acadêmicos. As tornam mais inteligentes e habilidosas com tecnologia, certo? Para Desmurget, estas pesquisas são tendenciosas e parciais e atendem a interesses da indústria digital.

“Essa ideia é uma verdadeira obra-prima de propaganda. Baseia-se principalmente em alguns estudos isolados com dados imprecisos, que são publicados em periódicos secundários, pois muitas vezes se contradizem. Em uma interessante pesquisa experimental, consoles de jogos foram dados a crianças que iam bem na escola. Depois de quatro meses, elas passaram mais tempo jogando e menos fazendo o dever de casa. Suas notas caíram cerca de 5% (o que é muito em apenas quatro meses!)'.

“Em outro estudo, as crianças tiveram que aprender uma lista de palavras. Uma hora depois, algumas puderam jogar um jogo de corrida de carros. Duas horas depois, foram para a cama. Na manhã seguinte, as crianças que não jogaram lembravam cerca de 80% da aula em comparação com 50% das que jogaram.”

A falácia da habilidade tecnológica como diferencial

Para o neurocientista, essa ideia de que os nativos digitais são muito bons em outras coisas, não existe. Vários estudos indicam que eles não são tão bons com tecnologia. Pois apesar de terem muita facilidade com jogos e aplicativos, tem dificuldade em processar e entender as informações disponíveis na internet.

'Para mim, essas crianças se assemelham às descritas por Aldous Huxley em seu famoso romance distópico Admirável Mundo Novo: atordoadas por entretenimento bobo, privadas de linguagem, incapazes de refletir sobre o mundo, mas felizes com sua sina'.

Se você chegou até aqui já percebeu o quanto o uso excessivo de telas faz mal a crianças e adolescentes. E já deve estar repensando o uso da tecnologia aí na sua casa não é mesmo? Mas afinal, qual o tempo ideal de uso de telas para crianças e adolescentes?

Tempo de uso de telas recomendado para cada idade

Para o neurocientista, as crianças passam muitas horas em frente às telas. Em média, crianças de 2 anos passam quase três horas por dia conectadas, crianças de 8 anos cerca de cinco horas por dia, e adolescentes ficam mais de sete horas online.

“Isso significa que antes de completar 18 anos, nossos filhos terão passado o equivalente a 30 anos letivos em frente às telas ou, se preferir, 16 anos trabalhando em tempo integral! É simplesmente insano e irresponsável.”

Para Sociedade Brasileira de Pediatria, o tempo de tela recomendado para cada faixa etária é:

• Bebês e crianças entre 0 e 2 anos: evitar a exposição de crianças menores de 2 anos às telas;

• Crianças entre 2 e 5 anos: limitar o tempo de telas ao máximo de 1 hora/dia, sempre com supervisão de pais/cuidadores/ responsáveis;

• Crianças com idades entre 6 e 10 anos, limitar o tempo de telas ao máximo de 1-2 horas/dia, sempre com supervisão de pais/responsáveis;

• Adolescentes com idades entre 11 e 18 anos, limitar o tempo de telas e jogos de videogames a 2-3 horas/dia, e nunca deixar “virar a noite” jogando;

Como diminuir o tempo de exposição às telas?

É inegável que a pandemia agravou o uso de telas em todo o mundo. Com as escolas fechadas, crianças e adolescentes se viram obrigados a assistir suas aulas 100% online. Além disso, muitos pais tiveram suas rotinas de trabalho transformadas em sistemas home office. Resultado: mais horas de exposição às telas.

Pensando nisso, a Sociedade Brasileira de Pediatria desenvolveu outro manual de orientação, para o período de pandemia. Nele, a entidade alerta para a importância do tempo gasto em cada atividade:

1) Tempo para saúde: horários de sono adequados para cada faixa etária. E uma alimentação equilibrada, com horários definidos para café da manhã, almoço, lanche da tarde e jantar. Ter tempo para fazer atividade física regular ou brincadeiras que movimentem o corpo.

2) Tempo para o relacionamento afetivo das crianças e adolescentes com seus familiares e seus amiguinhos. Permitir o uso de telas para diminuir o distanciamento físico. Sempre com gerenciamento dos pais e com limite de tempo, principalmente para as crianças pequenas.

3) Tempo funcional para assistir aulas e fazer tarefas. Isto vai depender de quantas horas diárias a escola oferece de aulas online.

4) Tempo para família se conhecer, brincar, conversar, estabelecer vínculos. Adotar a divisão das tarefas domésticas, ensinar as crianças a arrumar o quarto e armários e guardar as roupas. Preparar as refeições juntos.

5) Tempo para a proteção da privacidade. Orientar para os perigos online e como fazer o uso seguro das tecnologias. Ensinar sobre canais de denúncias e outras formas de crimes digitais.

Enfim, com a adequação da rotina da criança e do adolescente é possível controlar o tempo de exposição às telas sem que elas se sintam penalizadas.

Outras regras relevantes para evitar o uso excessivo de telas:

• Evitar o uso de telas pela manhã, antes de ir para a escola, ou a noite antes de ir para a cama;

• Evitar usar dispositivos eletrônicos quando estiver com outras pessoas;

• Não permitir que as crianças e adolescentes fiquem isolados nos quartos com televisão, computador, tablet ou celular;

• Estimular o uso de tecnologias nos locais comuns da casa;

• Para todas as idades: nada de telas durante as refeições e desconectar 1-2 horas antes de dormir;

• Oferecer alternativas como atividades esportivas, exercícios ao ar livre ou em contato com a natureza;

• Criar regras para o uso de equipamentos e aplicativos digitais, além das regras de segurança, senhas e filtros apropriados para cada idade;

• Atentar-se à classificação indicativa de filmes e programação de televisão. Evitando a superexposição de crianças e adolescentes a temas inapropriados a sua idade;

• Estabelecer momentos de desconexão e mais convivência familiar;

• Identificar o uso inadequado precoce ou excessivo de tecnologia, a fim de prevenir transtornos comportamentais associados à dependência digital;

O que esperar do futuro?

Não podemos negar que é muito mais difícil educar na era digital do que há 20 anos. A hiperestimulação que as crianças recebem por meio de jogos digitais é muito prejudicial. O que vimos são crianças atordoadas e hiperestimuladas. E consequentemente, entediadas com as brincadeiras mais simples. Resultado: embates, conflitos, dificuldade de administrar as frustrações e o tédio. Para Desmurget, esta geração enfrentará grandes desafios por conta do uso excessivo de telas, ele prevê:

“Um aumento das desigualdades sociais e uma divisão progressiva da nossa sociedade entre uma minoria de crianças preservadas desta 'orgia digital'... que possuirão, através da cultura e da linguagem, todas as ferramentas necessárias pensar e refletir sobre o mundo, e uma maioria de crianças com ferramentas cognitivas e culturais limitadas ... incapazes de compreender o mundo e agir como cidadãos cultos.”

Se hoje vivemos em uma sociedade polarizada, a previsão segundo o especialista, é de mais divisão. De um lado, os nativos digitais privados de conhecimentos importantes para o exercício da cidadania, focados em diversão e entretenimento. E de outro, adultos conscientes do seu papel e desenvolvendo todo o seu potencial, sua inteligência.

O desafio para nós pais consiste em regular o tempo de telas e oferecer novas possibilidades de interação para a criança ou adolescente. Reservando horários específicos para os jogos eletrônicos e para os momentos em família. Pensar seriamente no ser humano que estamos ajudando a construir. E no impacto da tecnologia no futuro de nossos filhos.

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Publicado Por Mariana Curotto
Mariana Curotto é formada em Comunicação Social com habilitação em Relações Públicas. Redatora de conteúdo online, gosta de escrever sobre o cotidiano, maternidade real e protagonismo feminino.

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